11/11/2010 9:26
A beleza pode ser medida?
Por Ana Candela
Imagine que sua câmera fotográfica lhe diga que percentagem estética tem a foto tirada.
Seria a câmera inteligente. Há quem diga que é um avanço em tecnologia e
inteligência artificial.
Outros, no entanto, a veem como algo aterrorizante porque será que uma
máquina pode medir a beleza?
Esta nova invenção se chama Nadia e é uma câmera de fotos muito particular.
Um projeto ainda em vias de desenvolvimento realizado pelo artista e desenhista de
origem australiana Andrew Kupresanin.
Primeiro você aperta um botão para tirar sua fotografia, não poderá vê-la no mesmo instante,
pois ela será enviada a um computador que, conectado à internet,
analisará a tomada realizada.
O segundo passo será esperar uma resposta. Momentos depois, você receberá na
parte traseira de sua câmera um sinal com a percentagem de beleza da foto.
O terceiro e último passo será descobrir se, por trás dessa tomada, se esconde
ou não um grande fotógrafo.
Para os bons profissionais é uma maneira fantástica de levantar o ego,
mas é preciso ter cuidado porque, para um fotógrafo amador,
pode ser o fim de uma bonita torcida.
A Nadia utiliza a tecnologia "acquine", um portal de internet com uma interface simples,
que desde 2009 se encarrega de qualificar automaticamente as imagens lá postadas.
A câmera inteligente atua com um dispositivo celular Nokia N73 conectado via
bluetooth
a um computador Macintosh que por sua vez está conectado ao portal "acquine".
Segundo diz Kupresanin à Agência EFE, este sistema compara uma imagem a um
conjunto de dados de usuários avaliados pelo portal photo.net.
Os parâmetros utilizados no "acquine" se baseiam nos grandes princípios do desenho
tais como cor, textura, enquadramento e exposição.
Por mais impossível que pareça, se trata de um algorítmo encarregado de delimitar
a beleza de uma tomada.
Um objeto conceitual
Esta câmera inteligente ainda não é uma realidade. O certo é que Nadia é só o
princípio do que pode vir.
A dúvida que se coloca é: em um futuro existirão dispositivos que tenham a capacidade
de pensar esteticamente por si sós?
Kupresanin tem certeza que sim e isto lhe gera uma dúvida: "Como este avanço
interferirá na definição de um cânone de beleza, em moldar nossos gostos e sobretudo,
até que ponto se modificarão nossos próprios processos criativos?".
"As respostas", diz, "estão no ar".
O protótipo desta curiosa câmera inteligente foi apresentado na Klasse Digitale da
Universidade das Artes de Berlim, na Alemanha. A iniciativa foi de Joachim Sauter
e Angesleva Jussi.
Na entrevista concedida à EFE, Kupresanin insiste no fato de que "este novo brinquedo
mais do que estar destinado a um uso comercial pretende produzir uma reação nas pessoas".
Nas palavras dele "é um objeto conceitual para gerar debate".
Este engenhoso artista abre uma dúvida e lança à opinião pública algo que para ele
é de vital importância: "Como encaixar todos estes avanços em nossa cultura?"
Do ponto de vista de Kupresanin, "é necessária uma reflexão conjunta antes de
lançar todas estas máquinas no mercado".
"A inteligência artificial é algo inevitável, os seres humanos são curiosos demais
para que não se transforme em uma realidade", comenta.
"Dentro da cultura pop e da sociedade da inteligência artificial é um tema
que se aborda com esperança, medo, cinismo, curiosidade e cautela",
esclarece o desenhista.
Inteligência artificial, emoções e fotografia
Que as máquinas pensem por si sós não é um tema de agora.
Um repasse da história da inteligência artificial a define como o ramo das
ciências da computação destinada ao desenvolvimento de agentes racionais não vivos.
Os sistemas de inteligência artificial são parte do dia a dia em campos como economia,
medicina e engenharia. Nesta linha já existem sistemas inteligentes capazes de tomar
decisões "acertadas".
A maioria das pesquisas no âmbito da inteligência artificial se centra nos aspectos racionais,
embora já hajam muitos que consideram seriamente incorporar componentes "emotivos"
a fim de aumentar a eficiência destes sistemas inteligentes.
Em relação a este tema o fotojornalista uruguaio Bernardo Paz comenta: "Todos sabemos
que os computadores não pensam, não tomam decisões, carecem de sentimentos por mais
que o cinema, a ficção científica ou os astutos diretores de marketing queiram nos fazer
pensar assim". "Um programa de informática só é capaz de fazer o que foi lhe determinado
que faça".
Um pouco de filosofia
A subjetividade na arte de fotografar foi cunhada pelo fotógrafo alemão Otto Steinert
que na década de 60 lançou os fundamentos teóricos que serviram para explicar as
diversas maneiras de fazer da fotografia moderna.
A fotografia é, entre outras muitas coisas, um testemunho da passagem do tempo e traz
consigo um componente emotivo demais para poder estabelecer parâmetros objetivos
e comuns.
"A fotografia é antes de mais nada uma maneira de olhar. Não é o próprio olhar", diz
Susan Sontag, romancista e ensaísta americana.
Quando se tira uma fotografia, esta permanece e quando se volta a olhar muito tempo
depois o que se sente? Como disse Sontag "a fotografia tem muito a ver com a nostalgia".
Que uma câmera possa nos dizer se nossa foto é mais ou menos "correta" no que se
refere aos formalismos técnicos é um avanço mas, até que ponto esta máquina poderá
avaliar as emoções de cada um?
Bernardo Paz acrescenta um comentário-chave para entender esta postura:
"O fato de que possamos escrever de forma correta não significa que nossa
descrição vá se transformar em uma obra de arte".
Perante este complexo entrecruzado de opiniões, o fotojornalista
lança uma questão vital:
"Uma fotografia tem que ser bonita para ser boa?"
Como diz Kupresanin, as respostas estão para chegar, cada um deveria se perguntar
até que ponto isto pode ser uma vantagem ou uma desvantagem.
"Estas são realmente as questões que a Nadia está pedindo. Espero que as pessoas
teste o "acquine" e tire suas próprias conclusões", conclui o desenhista.
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